****** ALERTA DE GATILHO!*******
Catarse, o “exorcismo” das almas; uma forte descarga emocional provocada por uma obra de arte ou por qualquer outro agente externo capaz de curar ou de aliviar um determinado sentimento. Sabe quando você está de fossa, põe uma música muuuuito depressiva, chora tudo o que tem para chorar e então se sente melhor, mesmo o problema não tendo sido resolvido em nada? Pois bem, catarse é isso.
E pode até parecer bobagem para muitos de vocês, mas a obra que mais me fez experienciar esse processo foi o filme “Mulher-Maravilha 1984”, longa massacrado pela crítica (na maioria, por homens héteros, o que me faz crer que esse filme é um tipo de “Velozes e Furiosos” dos gays), mas que fica no top 10 de filmes favoritos da minha vida fácil, fácil. Só não se tornou “O” meu filme favorito por conta daquele final decepcionante, que andou foi longe de cumprir o que os seus trailers e o seu roteiro prometeram.
E por que eu amo tanto um filme odiado por tanta gente e cujo final me decepcionou? Por conta da história da Mulher-Leopardo, personagem que nunca tinha chamado a minha atenção antes, mas cuja mistura das biografias de duas de suas versões nos quadrinhos acabou resultando em uma história de vida parecidíssima com a minha. Só faltou ela ter sido da igreja também para terminar de fechar o pack de coincidências.
Ter a sua autoestima no esgoto, ser desprezado por todos ao seu redor, além de ter uma inveja mortal da amiga bonita, inteligente e muito desejada; tudo isso pelo que a personagem passou no começo do filme eu também passei no período mais podre da minha vida, que foi a minha adolescência. Raquítico, pele lotada de espinhas, postura encurvada, dentição deformada, tremedeiras constantes pelo corpo, afeminado, desengonçado e tendo chegado ao ensino médio com 1,86m, 13 anos e idade mental de 8; ou seja, lógico que eu sofreria bullying pelo simples fato de respirar. E o resultado de todos esses anos em que eu sofri um bullying tão intenso foi o de eu sentir um ódio tão grande de mim mesmo a ponto de não aguentar nem me olhar no espelho.
E como que eu, com tanta desgraça na minha vida, comecei a virar o jogo? Da mesma forma que a vilã do filme, abraçando a minha Escuridão interior. Quando você finalmente consegue transformar toda a tristeza que veio acumulando ao longo de anos no mais profundo ódio, e passa a usar esse ódio como combustível , é que a mágica começa a acontecer na sua vida. Eu realmente me odiava e odiava quem me perseguia com todas as minhas forças, e poder finalmente colocar todo esse sentimento horrível para fora ( coisa que a minha religião não deixava, pois eu tinha “que amar meus inimigos” senão iria ser destruído no juízo final 😑😑😑) foi o primeiro passo que dei na longa jornada para poder me curar. Além de todo esse processo, uma outra coisa que também me ajudou bastante na minha jornada de cura foi ver cada um dos meus inimigos atingindo a mais absoluta miséria.
Uma coisa eu falo para todo mundo que possa estar vivendo essa mesma situação que vivi: não existe nada melhor do que o tempo passar e você encontrar quase todas as pessoas que te feriram na M-E-R-D-A. É rejuvenescedor! Mas ao contrário da personagem do filme que teve o enorme prazer de espancar o seu agressor até quase matá-lo (enquanto eu me derretia em lágrimas com os gatilhos que essa cena maravilhosa me proporcionou), eu não precisei mover uma palha para ser presenteado com a derrota dos meus inimigos, pois a própria vida fez isso por mim. Um, um professor que vivia me constrangendo no meio das aulas porque eu era afeminado e não pegava nenhuma menina (pq será?) acabou morrendo dois anos depois que o vi pela última vez, tendo o seu carro esmagado por um caminhão; outros dois, foram assassinados por facções criminosas; outro, morreu aos 30 e poucos anos de um AVC; outro, que era considerado o cara mais bonito e inteligente da minha turma e que todos juravam que passaria para medicina, ficou horroroso e passou a trabalhar em um subemprego; outra, que vivia mangando de mim e me chamando de v1ado e de retardado no meio do povo, teve uma tragédia tão bizarra no meio de sua família que não tenho como contar por aqui, pois muitos saberiam na mesma hora de quem eu estou falando (mas conto no pvd para quem se interessar); mas o que mais me causou orgasmos múltiplos de felicidade foi um que tinha as mesmas conversas dessa última para cima de mim, e hoje virou um mendigo assaltante viciado em drogas , sendo que até esmola já me pediu. Vocês não tem noção do tamanho da A-L-E-G-R-I-A que é ver alguém que já me perseguiu de todo jeito me pedindo esmola no meio da rua, enquanto todas as outras pessoas ao seu redor o evitavam. É, meus amigos, meu “santo” é forte, mas quem me conhece sabe que não é bem um santo que toma conta de mim.
Mas a cena que mais se assemelhou a um momento da minha vida, a que mais me fez viajar ao passado, foi a em que ela está fazendo seu segundo desejo para o outro vilão do filme, lembrando-me bastante de uma conversa que tive com uma certa Entidade décadas atrás. Aquela expressão no olhar fitando um ponto fixo à sua frente enquanto remói em milissegundos todas as merdas pelas quais passou na vida, você simplesmente não consegue mais nem ver nada à sua frente, porque é algo tão transcendental que a sua mente vai e o seu corpo fica. A única coisa que você consegue fazer nesse exato momento é SENTIR, enquanto vislumbra tudo o que você deseja mudar na sua vida
E o resultado dessa cena nós vemos logo a seguir, quando finalmente todo o rancor que a personagem veio acumulando ao longo do filme explode, transformando-a no monstro em que ela estava destinada a ser. Nunca tinha sentido medo em uma cena de ação de um filme de super-herói, mas vê-la pela primeira vez no cinema em uma tela imax, logo após meses de lockdown proporcionados pela pandemia, ao som daquela trilha sonora super tensa do Hans Zimmer, me deixou quase sem fôlego. Infelizmente o filme acaba bem aí para mim, porque a diretora/roteirista desarreda logo em seguida. 💔
Reviver os piores momentos da minha vida em duas horas e meia de filme foi uma experiência avassaladora, que fez com que eu fosse até o fundo do poço para, logo em seguida, ir até as nuvens. E essa vivência teve uma importância imensa para mim nos últimos anos, pois relembrar meus traumas do passado fez com que eu voltasse a ter o sangue no olho que eu tinha na época em que resolvi lutar, e então passei a deixar de reclamar de várias pessoas e situações que me adoeciam e voltei a agir, cortando todas essas coisas de forma definitiva da minha vida. E tudo isso graças a um filme com apenas 58% de aprovação no Rotten Tomatoes e a uma atriz que ficou famosa fazendo comédia e que eu nem sequer conhecia.